Cultura que gera renda: como o bumba meu boi e outras tradições impulsionam a economia criativa no Maranhão

No compasso dos tambores, entre fitas coloridas, bordados e danças vibrantes, pulsa uma economia que vai além da arte: a economia criativa. No Maranhão, manifestações como o Bumba Meu Boi, o Tambor de Crioula e o Cacuriá transformam cultura em trabalho, identidade em renda e tradição em inovação.

Com a chegada do período junino, os bairros de São Luís se enchem de vida e cor. Mas por trás dos espetáculos, há uma extensa e complexa cadeia produtiva que inclui artesãos, músicos, costureiras, produtores culturais e empreendedores criativos. A cultura popular deixa de ser apenas um ato de resistência e se consolida como um modelo sustentável de desenvolvimento econômico.

Gisele Ferreira, integrante do Boi da Floresta há 15 anos, é um exemplo claro de como o saber tradicional pode ser fonte de sustento. Desde pequena envolvida com o grupo, ela aprendeu diversas funções dentro do Bumba Meu Boi — de coreira a cazumba — e hoje também repassa esse conhecimento em oficinas de bordado.

“Tudo que a gente aprende, a gente passa para as futuras gerações. E usamos esse conhecimento para garantir uma renda extra”, relata Gisele, ao destacar o papel multiplicador dos saberes culturais.

O conceito de economia criativa se refere a atividades baseadas no capital intelectual, cultural e criativo. No Maranhão, essas atividades ganharam força com a profissionalização dos grupos culturais, que passaram a produzir e comercializar camisas, acessórios, CDs, DVDs e até NFTs.

Nadir Cruz, coordenadora do Boi da Floresta, relembra que, após a morte do esposo e mestre Apolônio Melônio, precisou assumir o grupo e reinventar sua forma de gestão. Uma das estratégias adotadas foi transformar o barracão do boi em atração turística, com roteiro de visitação e oferta de experiências como oficinas de bordado e apresentações.

“Fomos buscar capacitação em turismo, entender como precificar nosso trabalho e gerar renda a partir disso. Hoje, vendemos o turismo de experiência e formamos nossos integrantes para também atuarem como instrutores”, afirma Nadir.

Para alcançar esse nível de organização, foi preciso investir em formação. Nadir reconhece que há resistência de muitos grupos em participar de encontros e seminários sobre cultura, mas defende a importância da gestão cultural.

“Eu fui obrigada a participar para poder aprender. E buscamos parcerias técnicas com Sebrae, Sesc, Senai, UFMA, Fapema, entre outros. São trocas de saberes que têm nos ajudado em projetos, eventos e na manutenção do Memorial Apolônio”, explica.

De acordo com o Mapeamento Sebrae de Economia Criativa do Nordeste, o Maranhão representa 15% dos 515 negócios criativos identificados na região, sendo o terceiro estado com maior concentração. Dados do Observatório Itaú Cultural mostram que, em 2020, a economia criativa representou 3,11% do PIB nacional — o equivalente a R\$ 230 bilhões — e empregava 7,4 milhões de pessoas.

No ciclo junino de 2023, estima-se que mais de R\$ 100 milhões tenham sido movimentados apenas no Maranhão, segundo a Secretaria de Estado da Cultura. Hotéis lotados, barracas de comidas típicas, transporte e comércio informal aqueceram a economia local.

No Boi da Floresta, com cerca de 150 integrantes, a venda de produtos como camisetas, ecobags e agendas personalizadas tem se tornado fonte de renda contínua. Além disso, o grupo concorre a editais, capta patrocínios e aposta na capacitação de seus membros para fortalecer a comunidade e garantir sustentabilidade.

“Investimos nos nossos integrantes porque o conhecimento deles retorna para o grupo. Ainda não temos o que precisamos financeiramente, mas estamos caminhando com nossas próprias pernas”, reforça Nadir.

Mais do que preservar memórias, os grupos culturais maranhenses assumem hoje um papel estratégico no desenvolvimento econômico e social do estado. Enquanto o Boi dança e o tambor ecoa, o Maranhão se firma como um laboratório vivo de economia criativa, onde cultura e negócio caminham lado a lado e para frente.

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